Quando se descobre que o filho é gay, a primeira certeza que todos os
pais devem buscar é a clareza de que homossexualidade é espontânea.
Não existe de forma alguma a opção ou escolha de ser gay e esse
conceito é bastante errado. Os filhos não escolhem serem gays e não
existem elementos externos suficientes que possam nos influenciar a
tomar esse tipo de decisão. Não se decide ser gay. Decide-se se assumir
ou não.
Não nos tornamos gays se convivemos com gays, mas andamos com gays
porque em alguma medida nos identificamos. O que não quer dizer, de
forma alguma que, se o seu filho anda com alguns amigos gays, ele seja. A
juventude de hoje está cada vez mais disponível à diversidade e esse
conceito é bastante louvável. Evoluído, melhor dizendo.
No momento que o filho se assume gay ou os pais descobrem a real
sexualidade do filho, o mais importante é batalhar pela absorção desses
conceitos, novos conceitos. Em paralelo, é fundamental entender que não
existe culpa dos pais pois não existe uma fórmula de educação, trato ou
comportamento durante o processo de vida e socialização que levem o
filho a se tornar gay. Não existe o “tornar-se gay”. Existe o revelar,
se encontrar ou se aceitar.
Muitos pais de filhos gays ficam horrorizados quando a verdade vem à
tona. Alguns sugerem que o filho “seja gay mas não se relacione com
nenhum outro homem” – a exemplo do meu pai no começo. Outros ameaçam,
rejeitam e ao mesmo tempo se punem com o velho pensamento: “Aonde foi
que eu errei?”. Outros pais buscam pesquisas e estudos a respeito
enquanto as mães vivem entristecidas, deprimidas, procurando por uma luz
emocional que não vem. Esperam uma luz de fora, mas a luz – na
realidade – virá de dentro. E claro que hoje há aqueles pais que
absorvem essa realidade de maneira mais digna com todos os envolvidos,
incluindo eles mesmos.
A melhor dica para os pais de filhos gays é que peguem todos valores e
tentem se desprender do que a sociedade diz ou do que o próximo pode
dizer. O fundamental, nesse processo de aceitação e clareza entre filhos
gays e seus pais, é rever os próprios valores.
Lembra da piada que fizeram sobre gays outro dia? Pois é, esse hábito
pode continuar mas precisa mudar de sentido. Lembra do filho do amigo
que se falava “pelas costas”? Olha aí mais um hábito para se mudar!
Lembra que pais idealizam nos filhos seus sonhos e expectativas? As
idealizações podem continuar mas não será exatamente do jeito que se
espera. Aliás, quando é exatamente como se espera? Eis um ponto
importante: sabemos que os filhos esperam bastante dos pais e essa
necessidade é até bem clara na relação familiar. Já os pais também
esperam algo dos filhos, não é verdade?
Bem ou mal, certo ou errado, os pais também são “vítimas” de uma
sociedade historicamente heterossexualizada. Heterossexualidade é o que
se chama de padrão, é o modelo dito como correto, da retidão religiosa,
do machismo ou da tradição familiar. Mas no momento em que se descobre
que o filho é gay, são essas reflexões que devem ser levantadas: “afinal
de contas por que heterossexualidade é o correto?”. Não existe uma
linha restritamente correta quando o assunto é sexualidade e quem disse
que há, basta olhar para o mundo e, se não vê, está cego ou voltado para
dentro.
A religião nos impõe doutrinas, regras firmes e quase absolutas e,
nessa toada, diz que homossexualidade é pecado. A tradição familiar fala
da questão dos descendentes, da importância de herdar valores de pais
para filhos e seguir por uma linha de conduta. E quem disse que
homossexualidade está a parte da conduta? A avó, a bisavó, o imaginário
da tradição familiar?
Essa linha nada mais é do que o apego por regras e padrões. Regras e padrões duram para sempre?
Como seguir essa “linha” se, novamente, a homossexualidade é
espontânea? Das duas uma: brigar e impor uma postura rígida (em vão)
porque o filho pode até se submeter à força da tradição (ou de ameaças),
assumir uma vida heterossexual, ter uma esposa e filhos, mas em sua
essência – em sua intimidade – sempre vai morar o desejo pelo outro do
mesmo sexo e você, pai e mãe, que impõem condições pela tradição terão
que assumir pelo resto da vida (ou pelo tempo que o filho viver no
padrão de conduta esperado) o egoísmo, a frieza e até a amargura por ter
priorizado a ideia de que “filho meu não pode ser gay”. Priorizar os
valores do ego desse jeito, com a intolerância, são coisas de pessoas
cujos adjetivos não são dos melhores. Para vocês que são pais e pensam
assim, sinto em dizer que aprenderão sobre a tolerância vivendo e
sofrendo muito da intolerância. Esse caminho tende a armagurar. Mas quem
sou eu para dizer como PAIS devem fazer?
Ou, como segunda opção (e isso sim é uma escolha), romper com a
rigidez da tradição. As vezes nem se pensa ou se entende de onde vem a
tradição familiar. Por que se faz tanta questão com a tradição
referenciada na sexualidade? Talvez nem você saiba direito a resposta e
dizer “porque ter um filho bicha é inconcebível” é o mesmo que uma
criança imperativa pedindo por bala!
Quebrar paradigmas, reatribuir valores na relação de pais e filhos e
perceber que para a homossexualidade deve existir a tolerância – se o
objetivo é que seu filho seja realizado – são as oportunidades que a
vida traz a todos, pais e filhos, de viver sem fardas, hipocrisia e
imaturidade. Porque poupar a si da realidade homossexual de filhos,
sinto muito, não é amor. Querer que filhos sigam doutrinas e valores
tradicionais não é amor. Cadê a tão comentada “compreensão” que
exigimos, inclusive, de nossos próprios filhos no processo de educação?
(Pais viram crianças quando se descobre que o filho é gay, não é
isso? Muitos viram! Porque a mim essa coisa de intolerância é deveras
infantil!).
Devemos aceitar a espontaneidade das pessoas mesmo que essa
espontaneidade seja diferente do rigor do que, para pais, lhes foram
ensinado. Aliás, pais rigorosos seguem por regras da tradição por
escolha, mas a escolha nem sempre quer dizer uma consciência da mesma.
Lembrando que pessoas amadurecidas e capazes, hoje em dia, se desprendem
de valores herdados com muito mais flexibilidade para a conquista dos
próprios valores. Temos que ser cada vez mais capazes e mais adaptáveis.
Não é isso que, inclusive, os pais esperam dos filhos?
“Capacidade de adaptação” – tão lógico e claro quando os pais se
referem ao desenvolvimento profissional ou até mesmo humano dos filhos.
Tão obscuro quando o assunto tange a homossexualidade. Tradição, no meu
sincero ponto de vista, não pode ser o efeito de um muro, mas sim a base
para que filhos se fortaleçam e vivam o hoje com segurança.
Naturalmente, os “bons filhos gays”, muito preocupados por essa
“deficência social” buscam compensar de outras maneiras mesmo que
inconscientemente. E os bons pais que se deparam com essa “deficência
social”? Onde colocam suas virtudes nesse momento de aceitação?
Mais uma vez, queridos pais, a homossexualidade é espontânea e não se
opta. Opção vocês têm de viver com o sofrimento ou com a plenitude de
poder amar seus filhos sem barreiras. Pais normalmente mal entendem
porque são intolerantes com a homossexualidade e, tal qual crianças,
despejam autoritarismo em cima dos filhos quando o assunto é
homossexualidade!
“Porque filho meu tem que ser macho”. “Porque não aceito um filho
viado”. “Porque essa coisa de ser gay é falta de vergonha na cara!”.
Estou para ver pais que lancem essas frases ao ar diante dos seus filhos
gays e saibam explicar essas ideias de maneira clara como se espera de
pais.